domingo, 27 de dezembro de 2009

FOSÉ LINS DO REGO E OS MISSIONÁRIOS FRANCISCANOS

FREI MARTINHO NAS OBRAS DE JOSÉ LINS DO REGO

No livro inédito de Frei José Milton de Azevedo Coelho "FEI CASIMIRO BROCHTRUP, O APÓSTOLO DOS MOCAMBOS - DA MEMÓRIA À PROFECIA", há um capítulo em que o autor focaliza a presença do missionário francisano Frei Martinho Jansweit, OFM, em algumas obras do romancista José Lins do Rego.
A partir de uma conferência de Frei Martinho por ocasião do Encontro dos Padres Comissários da Ordem Terceira Franciscana, em 1928, Frei José Milton nos leva ao pensamento do romancista José Lins do Rego sobre as Santas Missões, especialmente sobre o Apóstolo da Paraíba, o santo missionário alemão (de alma brasileira) Frei Martinho Jansweit.
Naquele encontro dos Comissários da Ordem Terceira Franciscana dizia Frei Martinho:
“Não há nada mais próprio para garantir o sucesso das Missões do que a Ordem Terceira. É sabido que as Missões, sendo dias de entusiasmo e de graças, abrasam, entre o nosso povo, o fogo de um novo fervor, embora, geralmente, não continue por muito tempo, e, extinguindo-se pouco a pouco, surta diminutos resultados permanentes. Sigamos os exemplos dos antigos conquistadores. Tomado um país ou uma fortaleza, em breve a marcha vitoriosa continuava. O conquistador, porém, bem sabia que, para garantir os primeiros sucessos, era preciso avassalar o espírito do povo submetido. Eis as guarnições, a assegurarem as novas possessões. O mesmo caminho se abre ao Missionário. Reconquistada uma paróquia para Cristo, coloquemos nela a guarnição da Ordem Terceira. O que se pode alcançar com o povo brasileiro, atesta o exemplo do grande Apóstolo da Paraíba, Padre Ibiapina. Acaso, poderemos desejar, para nós, um espírito mais apostólico na fundação de fraternidades terciárias?” (Destaque nosso).
E como calhou, lindamente, a referência de Fr. Martinho ao maior Missionário do Nordeste, o Padre José Antônio Maria Ibiapina, cujo processo de canonização, em nossos dias, se acha em pleno andamento! Nenhum Missionário, entre nós, realizou até hoje, um apostolado tão marcado, conscientemente, por obras como as do Padre Ibiapina, visando aos frutos concretos das Santas Missões: Casas de Caridade (com suas “Beatas”, prédio próprio, patrimônio, hospitais, açudes, cemitérios...) a não ser, o Missionário Apostólico Pe. Francisco José Correia de Albuquerque, precursor e do Padre Ibiapina, falecido em Bezerros / PE, em 1847 ou 1848, e de quem Ibiapina foi continuador, na mesma linha missionária apostólico-social.
Permitam-me trazer à baila algumas reflexões a partir do que o escritor José Lins do Rego nos deixou em páginas sobre as Santas Missões. Primeiro, da obra Meus Verdes Anos. Se nos socorremos desse livro autobiográfico, ficamos sabendo da impressão negativa que as Santas Missões deixaram na mente da criança:
“Se chegavam frades para as santas missões, o povo corria para o regaço de Deus. Os franciscanos, ou os padres da Penha [os Capuchinhos], apareciam nas cidades do interior e arrebatavam dos vigários as rédeas do governo espiritual. As missões aterravam o povo que se agregava para ouvir os pregadores, como se corresse para uma briga. O Deus dos frades gritava, enfurecia-se, maltratava os matutos que tremiam de medo.” [1]
Mas não era só. O menino José Lins ouvia, em casa, freqüentes críticas aos padres. O avô e a família não praticava a religião. As tias não tinham feito nem a Primeira Comunhão.
“O meu avô não tomava conhecimento dos mexericos. Nunca a tia Maria entrou num confessionário. Nada de conversas com padre. (...) Para mim, aquelas irreverências a padres me fizeram desacreditar em muita coisa. O padre Severino concorreu em muito para secar-me a alma de fé (com sua vida escandalosa). Só mais tarde me chegaram os momentos de crença.[2]
Certamente o menino ainda não tinha ouvido falar de Frei Martinho. Nada transparece em Meus Verdes Anos da ação daquele Missionário que palmilhou todos os recantos da Paraíba, pregando Missões populares, substituindo vigários, acompanhando os Bispos nas Visitas Pastorais, construindo igrejas.
Agora, a experiência do adolescente “Doidinho”, o mesmo Carlinhos, neto de José Paulino (ambos personagens de “Menino de Engenho”. No romance Doidinho, o menino é quem fala:
Estava pregando na igreja um frade franciscano. O padre Fileto viera pedir ao diretor para levar o colégio às práticas. Eu ouvia falar nos frades que faziam missões. As negras dos engenhos caminhavam léguas atrás dos missionários, e vinham contando horrores dos capuchinhos de barbas grandes. Davam nas mulheres com os cordões dos hábitos e as palavras desses homens soavam aos ouvidos delas como vozes de santos. Por isso, quando ouvia falar das missões me vinham logo à cabeça as latadas de palha, os frades de pé no chão, os pecadores apanhando de corda, os amancebados que se casavam na hora. E naquela noite ia eu ver pela primeira vez um frade em carne e osso, um daquele brabos servidores de Deus.
A igreja já estava cheia quando lá chegamos. Um púlpito armado no meio do templo esperava o pregador. E ele chegou, alto, louro, com um hábito escuro, de alpercata nos pés. Ajoelhou-se, e a igreja ajoelhou-se com ele. Fez o pelo-sinal com os braços longos e a voz compassada. Começou a falar. Falava manso, uma palavra doce, sem gritos e sem gestos. Ouvi o dr. Bidu dizendo para o seu Maciel: - E mais um conferencista do que um pregador. Fosse o que fosse, o certo é que o que ele dizia eu tomava para mim.
Ele se voltava para os setenta meninos do colégio: - "Uma vez Jesus ia pelo caminho, e um bando de meninos alegres procurou o Mestre para falar com ele. Os Apóstolos botaram para trás as crianças, com palavras ásperas. E Jesus lhes disse: Deixai os meninos, deixai que eles venham a mim, porque deles é o reino dos céus.” E depois deitou a mão pelas cabeças dos inocentes, e se foi dali.
O frade botava os olhos azuis para nós todos, e só falava para o colégio. Jesus amava os meninos porque eles eram a virgindade da vida. Eram a inocência, a alegria feliz, a alma limpa de culpa e de pecados. Mas nem todos os meninos eram assim. Havia os de coração imundo, crescidos no vício como adultos, meninos que empestavam os outros, que fediam à distância. Era doloroso que se ofendesse a Deus justamente com as flores que devíamos deitar a seus pés em oferenda. Sim, havia rosas sujas de lama, rosas imundas, emporcalhadas pelo mundo. Mas quem deixa os porcos invadirem o jardim do Senhor? Os pais, as mães, os educadores. E repetia as palavras do Evangelho, aquelas que se referem aos que escandalizam os pequeninos. Melhor seria, dizia o Senhor, que lhes amarrassem uma pedra no pescoço e os deitassem ao rio. “Procurem os colégios, entrem nos lares de hoje, e é Deus quem falta em tudo, ou é Deus que é ali mesmo esbofeteado sacrilegamente.”
E a prédica continua a se referir à educação dos nossos dias, à impiedade das escolas públicas e dos colégios particulares.
Quem não gostou de nada foi o Diretor do internato, o sádico professor Maciel, torturador profissional de crianças. Já no princípio da pregação de Frei Martinho, Doidinho ouvira o que o Dr. Bidu cochichara para ele. No outro dia, na hora do café, Doidinho prestou atenção à conversa do Diretor com D. Emília:
- A prédica de ontem foi para mim. Eu conheço muito bem o Fileto. Botou na cabeça de frei Martinho aquelas indiretas para o meu colégio.
Não me botaram aqui meninos para aprender a rezar.
E a mulher confirmando:
- Eu é que não vivo em igreja, feito barata tonta de sacristia.
Na hora da aula foi logo chamando o sobrinho do padre. Ia com sede nele. (...) O sobrinho do padre ficou chorando.
– Era o que me faltava. Não sabe a lição e ainda me vem com choro. Passe-se para cá.
E o bolo aliviou a raiva da véspera, da prédica do frade. (...) E o bolo cantava na sala.” [3]
Frei Martinho se ordenou sacerdote em 1900 e faleceu em João Pessoa a 29-7-1930. Os primeiros romances do ciclo da cana de açúcar de José Lins do Rego têm como alvo a Zona da Mata paraibana do final do século XIX e princípio do século XX, berço do romancista. Fr. Martinho já atuava então como jovem sacerdote naquelas regiões. No romance Doidinho, Frei Martinho surge como um Missionário cheio de compaixão e acolhimento, defende as crianças, denuncia os maus tratos e os escândalos de que são vítimas na família e nas escolas, ameaça com as penas eternas os que escandalizam os pequeninos do Evangelho.
Por fim, vamos a um capítulo do romance Cangaceiros.
Em poucas páginas, cheias de poesia e emoção, José Lins do Rego evoca, a seu modo, o Missionário Frei Martinho, quando põe na boca do cantador Dioclécio, a solução para o amor de Bentinho e Alice:
“ - Agora é marcar o casório. Tem missões em São José [do Egito], do Frei Martinho. Dona Severina, porém, cortou a palavra: - Tem missão, é verdade, mas esta moça vai se casar é com banho. Vim aqui pra dizer isto, a menina não tem pai e não tem mãe; nós vamos fazer as vezes dos entes que estão faltando. A gente é pobre mas tem condições para tanto. [...]
- Rapaz, para que tanto alvoroço? Tudo está feito como deve ser. A gente vai amanhecer bem longe daqui e com mais uma pisada estamos em Floresta. As missões vai de manhã à noite. O casamento feito, tu toma destino melhor. É. Eu fico contigo. Vou te deixar no roteiro certo. [...]
Casariam em Floresta, nas missões do Frei Martinho e de lá mesmo ganhariam para longe. [...] E saíram pela mataria rasteira. A noite cobria-os de proteção. O céu estrelado, pinicando. Aí Dioclécio, baixinho, foi dizendo: - Tu tens que ir lá para baixo para trazer a moça, conforme o combinado. A gente toma a direção de Floresta e vai caminhar o resto da noite toda.
- Seu Dioclécio, estou com o dinheiro amarrado no cós da calça.
- Tu vai te casar e depois a gente encontra um jeito. O diabo é a moça fraquejar. [...] Bento falou calmo:
- Seu Dioclécio, foi Deus quem mandou o senhor para a nossa vida.
- Qual nada, menino. Temos ainda que andar o resto da noite. O frei Martinho casa os romeiros na missa da madrugada. [...]
Bento e Alice, conduzidos pelo cantador, fugiam da terra dura e assassina. [...]
- Está vendo? Vamos de rota batida. Se não, vem chegando a força e pega a gente. Isto é o sertão, rapaz. Chegando em Floresta, tenho que cortar este cabelo. Estou que nem um penitente. Vamos embora! [4]
Só que o Missionário por excelência de Floresta, era Frei Casimiro Brochtrup, confrade e contemporâneo de Frei Mrtinho. Liberdades de romancista, ainda mais paraibano, do torrão marcado pelos suores apostóloicos de Frei Martinho Jansweid... E sob “o impulso de forças que ele (o romancista) não pode controlar”...[5]
Nos romances, a figura dos padres é tratada com muito respeito, diria mesmo, com carinho, por José Lins do Rego. Que pessoa, por exemplo, a do Padre Amâncio, em Pedra Bonita! E em Doidinho, como o escritor transfere para o menino a imagem que ele mesmo faz do Missionário ideal!
José Lins do Rego, perpetuou na Literatura a memória do Apóstolo da Paraíba, cujo túmulo é venerado no Convento de Nossa Senhora do Rosário, em Jaguaribe, João Pessoa. Naquelas páginas finais do romance do cangaço, como repisa (é de seu estilo) sobre as missões de Frei Martinho! E no romance “Doidinho”, toma o Apóstolo da Paraíba como arquétipo do Missionário Popular, numa síntese artística que ultrapassa as fronteiras do Nordeste e mesmo do Brasil. É o universalismo da Arte e da Fé. No fundo, o Arquétipo por excelência: Jesus Cristo. Logo depois, o santo sem fronteiras: Francisco de Assis, no seu amor ao Cristo cósmico do Cântico das Criaturas, no abraço do leproso, no cuidado com o Irmão Lobo...[6] É possível que também à influência do Missionário Frei Martinho se possam atribuir “aqueles momentos de crença” do homem José Lins do Rego a que o autor se refere em Meus Verdes Anos.



[1] REGO, José Lins do -, Meus Verdes Anos, José Olympio Editora, Rio de Janeiro, ano 2000, 6.ª edição. Cf. pp. 192, 193.
[2] Id. Ibd. p. 192.
[3] REGO, José Lins do -, Doidinho, José Olympio Editora, 38.ª edição, Rio de Janeiro, ano 2000, pp. 68 a 71.
[4] REGO, José Lins do -, CANGACEIROS, José Olympio Editora, 10 edição, Rio de Janeiro, RJ, 1999), pp.238 – 240. Cf. também in COELHO, Nely Novaes -, na sobrecapa da 10ª ed. de CANGACEIROS, sobre o estilo de J. Lins do Rego.
[5] COELHO, Nely Novaes -, ibd.
[6] Vide, aqui, o que José Lins do Rego falou sobre o Irmão Lobo aos alunos seráficos de Ipuarana (Lagoa Seca / PB), quando da inauguração do seu busto no Pilar, sua terra Natal: Livro III, Cap. V, 12.
Na década de 1950, José Lins do Rego visitou o nosso Colégio Seráfico de Santo Antônio em Ipuarana (Lagoa Seca /PB), acompanhado da esposa e vários intelectuais de Campina Grande e João Pessoa, ocasião em que fora inaugurar um monuento em sua honra em Pilar I(PB). O nosso seminário lhe prestou uma homenagem muito simples, dado o imprevisto da visita. Nosso coral entoou para os visitantes vários canções da autoria de frei Adriano Hipolito, futuro bispo de Nova Iguaçu. José Lins do Rego agradeceu com palavras cheias de gratidão e que refletiam a grande simpatia pela presença franciscana ali no alto da Borborema. Disse da alegria de ter diante de si os rostos de tantos jovens de todos os rincões do Nordeste. E nos incentivou a perseverar na vocação franciscana certos de que "o irmão lobo" estava à nossa espera!" Foram palavras que até hoje ecoaram no meu coração. Mas não é por causa disso que o considero o maior romancista brasileiro dos tempos modernos. O mais nordestino, sem dúvida nenhuma!

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

UNIDADES DE CONSERVAÇÃO INTEGRADAS


Mosaico de proteção
Unidades de conservação integradas
POSTADO ÀS 14:01 EM 16 DE Agosto DE 2009
Frei Sinésio Araujo (*)
O litoral sul do nosso Estado existe cinco unidades de conservação de diferentes categorias ligadas institucionalmente ao Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio), do Governo Federal. Tais unidades, para terem alcançados seus objetivos, precisam de uma boa gestão e de trabalho coordenado entre elas. Isso é facilitado pela sua localização geográfica, já que estão em municípios vizinhos. A saída para uma gestão integrada seria a constituição de um Mosaico de Unidades de Conservação, previsto no Sistema Nacional de Unidades de Conservação através da lei 9985/2000, Cap. III, arts 8,9,10,11. Mosaico, na linguagem artística, é um desenho feito com pequenas pedras de várias cores, geralmente azulejos. São, portanto, pedaços separados, mas que formam um todo. Trata-se de uma composição de várias unidades de conservação que compõem uma área importante. O conceito de mosaico, na área ambiental, é um fator essencial para a promoção e defesa ambiental em termos biológicos, geográficos, sociais e principalmente administrativos.
Unidades de conservação do Litoral Sul de Pernambuco
RPPN Ipojuca – ICMBio – categoria: uso sustentável. Reserva Particular do Patrimônio Natural é uma área privada, gravada com perpetuidade, com objetivo de conservar a diversidade biológica. É permitida a pesquisa científica, visitação com objetivos turísticos, recreativos e educacionais.
Resex Sirinhaém/Ipojuca, na fase final de criação – ICMBio – categoria: uso sustentável. A Reserva Extrativista é uma área utilizada por populações extrativistas tradicionais, cuja à subsistência baseia-se no extrativismo e, complementarmente, na agricultura de subsistência e na criação de animais de pequeno porte, e tem como objetivos básicos proteger os meios de vida e a cultura dessas populações, e assegurar o uso sustentável dos recursos naturais da unidade.
APA dos Corais - Tamandaré, Rio formoso estendido até o Estado de Alagoas – ICMBio – categoria: uso sustentável. A Área de Proteção Ambiental é uma área em geral extensa, com certo grau de ocupação humana, dotada de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais especialmente importantes para a qualidade de vida e o bem estar das populações humanas, e tem como objetivo básico proteger a diversidade biológica,disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais.
Reserva Biológica -Tamandaré – ICMBio – categoria: proteção integral. Tem como objetivo básico a preservação integral da biota e demais atributos naturais existentes em seus limites, sem interferência humana direta ou modificações ambientais, excetuando-se as medidas de recuperação de seus ecossistemas alterados e as ações de manejo necessárias para recuperar e preservar o equilíbrio natural, a diversidade biológica e os processos ecológicos naturais
RESEX - Rio Formoso na fase de criação – ICMBio – categoria: uso sustentável.
(*) Secretário de Justiça, Paz e Ecologia dos franciscanos no Nordeste
Postado por Verônica Falcão Artigos 1 Comentários permalink imprimir enviar topo
Postado do Blog Ciência e Meio-Ambiente do Jornal do Commercio em 16.8.2009 -
Artigo de Verônica Falcão
Reserva Extrativista da Barra de Sirinhaém – Continuidade de um Trabalho em favor da Justiça, Paz e Ecologia.


Residiu no Convento de São Francisco da Cidade de Sirinhaém, Estado de Pernambuco nos anos 80 do século passado, um frade franciscano, chamado Frei Francisco Hilton Botelho juntamente com frei Marconi Lins de Araújo vigário da Paróquia e guardião do convento e mestre dos postulantes à vida religiosa franciscana. Frei Hilton conheceu a população tradicional dos pescadores do estuário do rio Sirinhaém que habitava nas 17 ilhas, eram aproximadamente 53 famílias que viviam da pratica da pesca artesanal estuarina associada com a criação de animais de pequeno porte. Tais famílias sofreram várias ameaças para deixarem seu lugar tradicional de moradia e trabalho no qual sempre contaram com a colaboração e apoio deste frade. Um problema latente que perdura até hoje é o crescente derramamento do vinhoto, no estuário, oriundo da produção do etanol, prática esta que causa impactos ambientais e se torna visível pela mortandade dos peixes. Tal prática criminosa tipificada na lei dos crimes ambientais anda perdura. Temos notícias que na época foram feitas várias denúncias aos órgãos ambientais. Frei Hilton sempre contou com a colaboração e “compreensão” dos frades e da pastoral social da Paróquia de Sirinhaém neste importante trabalho de cidadania e responsabilidade sócio- ambiental.

Com a transferência de Frei Hilton para Cairu, Bahia, o trabalho foi continuado com o apoio da Pastoral dos Pescadores, o ex - frei Bernardo Siry e frei Sinésio Araújo. Nesta época não contávamos com uma legislação ambiental capaz de assegurar a permanência dos ilhéus no seu habitat. Infelizmente, através de acordos forçados, ameaças físicas e psicológicas muitos dos ilhéus foram expulsos e só duas famílias ainda resistem na ilha do Constantino. Poderíamos citar inúmeras ameaças que frei Hilton sofreu juntamente com os ilhéus, mas fica o nosso registro deste frade compromissado com os princípios da justiça, paz e ecologia.

O advento da publicação da Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação – 9985/2000 foi a saída para resolver o conflito pela posse do estuário, já que as 17 ilhas ainda estão aforadas à Usina Trapiche através da Gerencia Regional do Patrimônio da União que sempre ignorou a presença dos nativos. O Sistema Nacional de Unidades de Conservação versa sobre a existência das Unidades de Conservação de uso Sustentável a exemplo das Reservas Extrativista e Reserva de Desenvolvimento Sustentável que asseguram a presença da comunidade tradicional no seu habitat. Entra em cena nesta nova conjuntura a Pastoral da Terra que juntamente com a Diocese dos Palmares, através de Dom Genival e duas entidades ambientalistas a ASPAN e a ECOS protocolaram no IBAMA, de Recife pedido para criação de uma Reserva Extrativista. Tal pedido voltou a incomodar a Usina Trapiche, os políticos locais, pois tal proposta empodera os pescadores no sentido que eles terão autonomia junto com os órgãos ambientais na gestão da área através da criação do conselho deliberativo da Unidade de Conservação.

A consulta pública organizada pelo Instituto Chico Mendes da Biodiversidade no dia 21 de agosto de 2009, na Barra de Sirinhaém, para a apresentação dos estudos sócio-ambientais da Unidade de Conservação foi marcada pela participação expressiva da categoria dos pescadores e de várias entidades que se posicionaram totalmente favorável
à iniciativa mesmo com toda a articulação contraria da Usina Trapiche, do Governo do Estado e da Prefeitura local. Este episódio pode ser em breve abordado.Frei Sinésio Araújo durante a realização da consulta pública foi alvo de críticas infundadas, e sem ambasamento técnico, a saber, que a Reserva Extrativista iria dificultar o desenvolvimento da Cidade. Contudo, muito ao contrario, ela será a indutora da economia sustentável no que beneficiará inúmeros pescadores associada à proteção do ecossistema, pois políticas públicas podem ser atraídas para esta Unidade de Conservação. Para acessar o estudo sócio-ambiental da Reserva Extrativista basta consultar o sitio: www.icmbio.gov.br no link consulta pública ( RESEX de Sirinhaém). Neste estudo temos a realidade social, econômica dos pescadores e os estudos biológicos com caracterização da fauna e flora costeira.

Frei Sinésio Araújo, OFM






sábado, 12 de dezembro de 2009

JUBILEU - 7O ANOS

O Colégio Seráfico de SANTO ANTÔNIO de
Ipuarana (lagoa seca /PB) -1939 – 1971.


I. As primeiras tentativas vocacionais
O mais grave desafio que se apresentava aos Restauradores da Província Franciscana de Santo Antônio foi, sem dúvida, o das vocações franciscanas. Desde o reconhecimento pela Santa Sé, em 1901, da autonomia da Província Franciscana de Santo Antônio restaurada, que se faziam tentativas vocacionais. As três primeiras décadas (1901 – 1939) desse renascimento foram marcadas pela busca de vocações brasileiras.
Houve várias experiências de abertura de um “Colégio Seráfico”:
1. O Colégio Seráfico de Salvador / BA (a 4 de fevereiro de 1900).
2. O Colégio Seráfico de S. Cristóvão / SE, para onde foi transferido o de Salvador a 15 de fevereiro de 1903.
3. O Colégio Seráfico de Olinda, em 1904, foi também de curta duração; pouco tempo depois foi transferido com seus professores Frei Pascoal Reuss e Frei Ciríaco Hielscher para a Colônia de Blumenau, no Estado de Santa Catarina.
3. O Colégio Seráfico de Vila de São Francisco, no Recôncavo baiano, para onde foi mudado em 1908, o de S. Cristóvão.

II. A partir de 1929 houve fundações vocacionais de maior porte, como o Colégio Seráfico de S. Antônio, com curso ginasial (João Pessoa, 1929-1940) e o Colégio Apostólico Diocesano-Seráfico de Canindé / CE, a partir de 1923 ao qual se agregou o Juvenato S. José para formação dos Irmãos leigos franciscanos(transferido para Penedo em 1970). Em vésperas de completar 70 anos, fechou as portas o Colégio Diocesano-Seráfico, como aconteceu a tantos outros seminários do Brasil. Anexo ao Convento franciscano funcionou uma escola Apostólica para enviar alunos a Ipuarana.
As Escolas com curso primário: Escola Apostólica de São Pedro Gonçalves (João Pessoa, 1941-1960); a Escola Apostólica Dom Frei Eduardo (Paripe /BA, 1940-1942); a Escola Apostólica Frei Camilo de Lelis (Penedo/AL, 1943-1845); a Escola Apostólica de S. José (Tianguá /CE, 1940-1960); a Escola Apostólica de Canindé; a Escola Apostólica de S. Boaventura (Triunfo / PE, 1947-1960).

III. O Colégio Seráfico de Santo Antônio de Ipuarana

A solução definitiva para o problema vocacional da Província Franciscana de Santo Antônio só viria com a fundação de um grande seminário.
O Congresso Definitorial de janeiro de 1939 criara uma comissão integrada pelo Ministro Provincial Frei Humberto Triffterer, Frei Matias Teves e Frei Norberto Holl para estudar o plano de ação. No dia 4 de agosto de 1939 Frei Pedro Westwemann e Frei Matias se deslocavam para Lagoa Seca quase sem esperança e “quase unicamente movidos pela responsabilidade”, como escreve Frei Pedro em sua crônica. “Grande foi a surpresa – diz Frei Pedro - de encontrarem um local ótimo, com todas as condições desejadas, no lugarejo de Lagoa Seca, à época também chamado de Ipauarana. Em 26 de setembro de 1939 era realizada a compra do terreno por 9 contos de réis (correspondendo à metade do preço, porque um dos proprietários renunciara à sua parte em benefício dos frades)” . Frei Pedro foi a pessoa escolhida para dirigir os trabalhos de construção. Ele mesmo elaborou um, anteprojeto, que foi desenvolvido por um arquiteto do Recife, , Heitor Maia Filho. A 28 de novembro de 1939, uma Terça-feira, Frei Pedro e Frei Lamberto [Hoetting, falecido na Alemanha a 16-2-1978, com 48 anos de vida religiosa] mudaram-se para o local a fim de dar início aos trabalhos, e a eles associou-se, no mês de janeiro, Frei Manfredo, estes três constituindo a primeira comunidade franciscana de Ipuarana.
Surgia, assim, o Colégio Seráfico de Santo Antônio, em Ipuarana (ou Ipauarana, hoje, Lagoa Seca / PB), nas proximidades de Campina Grande, numa das colinas mais bonitas da Serra da Borborema. A 28 de janeiro de 1940 – em plena Guerra – o Senhor Arcebispo da Paraíba, Dom Moisés Coelho, procedia à Bênção da primeira Pedra, com a presença do Clero de Campina Grande, do representante do Interventor Federal Argemiro de Figueiredo, do Prefeito de Campina Grande, Bento Figueiredo, e de uma multidão de moradores de Lagoa Seca e dos sítios vizinhos.
Em 22 de março de 1941, a construção já estava em condições de abrigar os primeiros alunos, não os do Curso Secundário, a que era destinado, mas sim de duas classes preparatórias, num total de 19 meninos, sob os cuidados de Frei Gervásio Michels [falecido em Canindé, a 5-12-1994, com 57 anos de sacerdócio] e Frei Artur (e foi assim que o primeiro dos ipuaranenses vivos [Fr. Artur] a ocupar seu posto foi também o último a não abandoná-lo – ali permanecendo até o dia de hoje [...]. No final do ano, 11 destes alunos foram promovidos ao 1º Ano Secundário (entre eles , Simão Arruda – o “Frei Felício” -, primeiro aluno na matricula - e João Poluca, o “Frei Roberto”). Aí, nordestinos de todos os rincões, se preparavam para a entrada na Ordem Franciscana.

Quase 1.500 alunos passaram por Ipuarana nos 30 anos de sua existência como seminário. Destes, apenas 72 chegaram ao sacerdócio; 30 perseveraram na Ordem, dos quais 5 já faleceram; 11 se ordenaram para o clero diocesano (padres seculares) dos quais um é Bispo; um é beneditino.[1]
Mas não se pode fugir à eterna e indefectível pergunta: Por que o Seminário de Ipuarana teve que fechar? [...] É bom lembrar que, a essa altura, todas as Escolas Apostólicas já haviam sido extintas: Triunfo, Tianguá, João Pessoa.
E muitos seminários seculares e de outras Ordens religiosas também já haviam fechado. Não existiam mais fontes param fornecer inquilinos para Ipuarana., nem Ipuarana possuía um sistema de recrutamento próprio, resultando daí que foram aceitos candidatos sem uma melhor seleção e preparo, só com o objetivo de se chegar a um número razoável. Boa parte dos frades, sobretudo os mais novos, já não acreditavam mais em seu sistema vocacional.

A Direção da província, depois de debater a situação com os educadores, ainda pediu o parecer por escrito de cada um. Todos foram unânimes em que, ao menos por enquanto, não tinha sentido o Seminário de Ipuarana continuar funcionando. Na opinião dos últimos professores, os alunos estavam sendo antes prejudicados que favorecidos pelo ambiente do Colégio. E o Definitório, de 3 de dezembro de 1971, resolveu fechar por algum tempo o Seminário e “instituir uma Comissão Especial para estudar o que fazer , no futuro, com o Colégio Seráfico, excluída a possibilidade de deixá-lo sem aproveitamento”.
Hoje a prova mais importante de que Ipuarana continua viva pode ser encontrada no bom número de seus ex-alunos que continuam atuando e dando o seu testemunho da vocação religiosa, como frades e sacerdotes na Província de Sto. Antônio.

“Mas nem seus ex-padres deixam de contar pontos para Ipuarana, seja pelo tempo em que trabalharam como sacerdotes e religiosos (não raro eles foram bons sacerdotes e religiosos – e o bem que foi realizado ninguém pode apagar), seja como os demais ex-alunos, quando por sua vida profissional e familiar dão em seu ambiente um testemunho de fé cristã e franciscanismo.[2] Concluindo – escreve Frei Hugo - podemos afirmar que o seminário de Ipuarana representou para a Província de Santo Antônio um marco de singular importância em sua obra de restauração”.[3]
O atual Guardião de Ipuarana, Fr. Osmar da Silva, tem cuidado, com um zelo admirável e muito bom gosto, do Convento e do antigo Colégio, adaptando-os, de maneira prática e harmoniosa, à nova realidade de Centro de Treinamento. É um prazer hospedar-se em Ipuarana!

Frei José Milton de Azevedo Coelho, OFM


BIBLIOGRAFIA:
Cf. PEREIRA, Carlos Almeida -, Ipuarana 2000, - Refazendo uma Caminhada , Lagoa Seca / PB, - Belém / PA, 1999, p. 79 - 81
- Cf. PEREIRA, Carlos Almeida -, op. ci. pp. 68 – 75..
-FRAGOSO, Fr. Hugo -, OFM, op. cit. p. 194.
Apud FRAGOSO, Fr. Hugo -, OFM, Uma contribuição para a história vocacional da Província Franciscana de Santo Antônio, apud: AZZI, Riolando - (Organizador),Vida Religiosa no Brasil – Enfoques Históricos”, Edições Paulinas, São Paulo, 1983, p. 180.
Cf. I Livro de Crônica do Convento de Nossa Senhora das Neves, de Olinda, 1904, p. 2.