quinta-feira, 1 de novembro de 2012

A HORTA DO CONVENTO FRANCISCANO DE NOSSA SENHORA DAS NEVES DE OLINDA NOS FINS DO SÉCULO XVI
Vamos primeiro aos Anais da Bibl. Nasc. Vol XXIV (1902) pg. 301-310:
“ No Capítulo XVI das “Glórias de Pernambuco” em que D. Domingos de Loreto Couto trata dos religiosos naturais de Pernambuco que na Ordem Seráfica floresceram em virtude e doutrina, lemos este preâmbulo:
Horto chamou a Ordem Seráfica o Sumo Pontífice  Nicolau III, e com muita propriedade, porque nos hortos,  à  diferença dos campos,  em todas as estações do ano, nascem novas plantas e se produzem novos frutos, e a Ordem Seráfica desde sua fundação, em todos os tempos, está dando novas plantas para delícia da devoção e exemplo das virtudes.
Esta maravilhosa fecundidade se admirou sempre no célebre Convento de Nossa Senhora das Neves da Cidade de Olinda, terreno feliz, que tem dado à Religião  maravilhosos frutos em religiosos que, com suas virtudes, edificaram não somente esta cidade e Província de Pernambuco, mas todas as partes de nosso Brasil (detaque nosso).
Com a palavra agora  o historiador José Antônio Gonçalves de Mello em sua obra Diario de Pernambuco: Arte e Natureza no 2º Reinado (Recife – Fundação Joaquim Nabuco, Editora Massangana, 1985, p. 205):
“O Convento Franciscano de Nossa Senhora das Neves, de Olinda, teve também a sua boa horta, a cujo trato se ofereceu  Frei Pedro de Mealhada, mais cohecido como Frei Pedrinho, nos fins do século XVI, o qual dedicou seu trabalho ao jardim e à horta do Convento, ´plantando flores e hortaliças´.[i] 
Outro Franciscano, Frei Antônio do Rosário, (1647-1704), autor de livro intitulado Frutas do Brasil numa nova e ascética monarquia (1702), mandado imprimir em Lisboa às custas de um ´mascate´ do Recife, relaciona 36 árvores de fruto aqui cultivadas, várias das quais exóticas, mas perfeitamente aclimatadas. Com esse livro a flora brasileira, sobretudo a do Nordeste, entra na literatura alegórica de intenção religiosa” (grifo nosso).

 
                                              Berinjela à mostra

                                                                                                                                                
 FLOR DE BAUNILHA




                                                                                                                                                      FRUTOS DE BAUNILHA

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Na década de 1990, no Convento de Olinda, os frades cultivam verduras e plantas medicinais. Tinham um laboratório fitoterápico muito procurado sobretudo pelas camadas menos favorecidas de Olinda. Não são poucos os que ainda hoje (ricos, remediados e pobres)  agradecem terem ficado bons de seus males graças áqueles medicamentos naturais.
    
Plantavam berinjelas, nabo, alface, rúcula, cenoura, beterraba, tomates, açafrão de batata (gengibre-doce), mostarda, coentro, acelga, gengibre, feijão guandu, chicória...
Entre as plantas medicinais merecem destaque: o chapéu-de-couro (echinodorus macrophillus;  chá mineiro), cana-do-brejo, losna, agrião-do-pará (jambu), maracujá-açu, alfavaca, sambacaitá (sambacuité ou alfazema brava), erva macaé, beladona, baunilha... 
Cultivavam minhocas para garantir o adubo; plantavam gergelim para afastar as formigas (as folhas do gergilim levadas por elas não permitiam a formação do mofo de que se alimentam e , assim, as obrigavam a procurar outras paragens).



Falamos acima em Frei Antônio do Rosário. Gostaríamos de transcrever um trecho de um escrito dele maravilhoso tanto pelo conteúdo místico, como pela poesia da  linguagem.
Mas antes o que sobre ele escreve a Professora Maria do Carmo Tavares de Miranda:
“Frei Antônio do Rosário é português, natural de Lisboa. Primeiramente tomou o hábito de agostiniano descalço no Convento do Monte Olivete, tendo então sido Lente de Filosofia, Pregador e Visitador Geral de sua Ordem. Posteriormente torno-se sacerdote secular e missionário e assim é que o vemos, inicialmente, no Brasil. Ingressa após , em 1686, na Ordem dos Frades Menores, onde professa durante a gestão de Frei Domingos Archangelo, ‘Provincial intruso das partes de Pernambuco’, como diz Jaboatão, e esta a razão pela qual deveu ratificar os votos a 2 de junho de 1689, no Convento de Olinda. Homem de virtuso saber, é apóstolo zeloso para o pastoreio das almas, e renomado missionário volante. Tem como fim conduzir o homem nos caminhos de Deus e reconquistar para o aprisco divino as ovelhas desgarradas. É Autor de várias obras, muitas escritas ainda em Lisboa, e como agostiniano descalço, e outras já no Brasil e como franciscano, convindo que destaquemos entre estas também o livro Frutas do Brasil, em uma nova e ascética Monarquia, publicada em três edições: 1702, 1828 e 1830. Faleceu a 8 de setembro de 1704, no Convento da Bahia.
Na sobriedade  e austeridade do Convento de Ipojuca, realçando a beleza arquitetônica e o estilo próprio do franciacano que intui a paisagem para dar a forma de vida aos seus conventos e igrejas, Frei Antônio do Rosário é o suave poeta que deixa transparecer o pregador e missionário,  cantor e profeta, que suplica, implora, aponta ameaças e castigos; é terno e apocalítico ao mesmo tempo.
Lamentação  que termina em Ato de Contrição: os seus pecados a chorar são prantos por amor à terra e ao povo, é pedido de clemência ao Deus e Senhor a quem crê, espera e ama.
É o franciscano que formou o Brasil: nada tendo, dando-se totalmente, assumindo a terra e o povo, amando, não só pela admiração de uma beleza ou de um pitoresco, mas amando até o fazer-se da terra e do povo, carregando consigo as culpas e os pecados, como pai que aos filhos repreende, ama e se doa, e, repetindo com Francisco de Assis, em Cantos e Louvores, a alegria e amor a cada coisa, e o amor de Deus em tudo, até ao “é morrendo que se vive para a vida eterna” .
 (Maria do Carmo Tavares de Miranda: Os Franciscanos e a Formação do Brasil, Recife, Universidade Federal de Pernambuco, 1969, pgs. 281-282).
Na próxima postagem, transcreveremos de Frei Antônio do Rosário o escrito poético e místico de falamos.



[i]  JABOATÃO, Frei Antônio de Santa Maria, Novo Orbe Seráfico Brasílico 5 vols, (Rio de janeiro 1858 -1862) II p. 317.

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